O Free Style Motocross ou FMX possui uma jornada ousada desde suas origens até os dias de hoje. A modalidade começou a ganhar destaque no mundo na década de 90, especialmente nos Estados Unidos, com os pilotos realizando acrobacias a partir de rampas. Sua evolução veio a partir do uso das motocicletas mais potentes usadas no motocross e preparadas para realizar os saltos acrobáticos de alto risco.
A inserção da modalidade FMX nos X-Games, em 1995, foi fundamental para o reconhecimento pelo público e maior incentivo aos pilotos. Nomes como Travis Pastrana, Jeremy McGrath e Phil Lawrence elevaram o perfil do esporte e ajudaram a catapultar a modalidade, realizando manobras de alto risco como o backflip (rolamento para trás) e o double backflip (duplo rolamento para trás).
No Brasil, o Free Style Motocross começou a se popularizar nos anos 2000 e rapidamente se inseriu na cultura dos esportes radicais, como o skate e o BMX. Com a combinação de habilidade, criatividade, técnica e coragem, o FMX se consolidou no universo off-road e hoje se reflete em vários talentos nacionais, como o piloto GaiaMX de São Paulo, Diego Djandjian, um dos maiores nomes do esporte no Brasil.
Com 40 anos, e pai da Sara, de 8, Dieguinho, como é chamado pelos amigos, sofreu um grave acidente e quebrou o fêmur quando disputava o FMX International 2024, na cidade de Atibaia, dia 31 de maio. Desde então, vem lutando contra uma difícil recuperação e nos contou um pouco de sua trajetória, estilo de vida e como tem lidado com um ano cheio de desafios pessoais e profissionais.
Em que momento da sua vida você descobriu que a moto era a sua paixão?
Na verdade, a moto é minha paixão desde que eu me entendo por gente. Eu costumo falar que eu nasci piloto, e eu sempre soube que eu era piloto. Desde moleque, o pouco de contato que eu tinha com a moto era através das revistas e do que eu via pela TV. Nessa época, eu já sabia que esse era o meu caminho e falei:
— Cara, a minha vida vai ser conduzida nessas trilhas, literalmente, mas infelizmente com várias divergências e contramão. Minha família não aceitava tanto, e lembro que eu pedia muito uma minimoto quando era moleque e ouvia aquele papo de pai: “Ah, não, vá procurar outra coisa para fazer!” E eu sempre batendo muito nessa tecla. No fim, eu não ganhei e esperei longos anos para ter minha moto. Comecei a andar depois de velho, já tinha 24 anos. Foi um longo processo até eu ter uma opinião própria, uma voz ativa. Eu também tive uma tia que me apoiou muito no início para conseguir entrar no esporte.
Como você se sentiu logo após o acidente e qual foi o seu primeiro pensamento quando percebeu a gravidade da lesão?
Esse não foi o meu primeiro acidente, e já estou acostumado com esse lado escuro do esporte que são as lesões, as cirurgias e as fraturas. Porém, eu nunca tive uma fratura no fêmur e, cara, eu não vou falar que foi a minha pior fratura, mas talvez tenha sido a minha pior reabilitação. Foi muito doloroso no início. Tive uma dor física tremenda, talvez até pela minha idade. Os outros acidentes eu era mais moleque, um outro tipo de recuperação. Quando eu soube que era o fêmur fiquei um pouco assustado. É o maior osso do corpo humano, como será que vai ser? Na cirurgia do fêmur, para colocar a haste o padrão é pelo quadril, mas no meu caso, colocaram a haste pelo joelho. Teve que desviar a rótula para colocar a haste. Não lesionou o joelho, mas teve que bagunçar tudo, tendão, rótula e ligamento para consertar o fêmur. A reabilitação foi a pior parte. Mas respirei fundo, cabeça no lugar. Sempre muito dedicado com a fisioterapia. Aos poucos, fui vencendo as quebras de fibrose. Toda semana fazia a quebra de fibrose para recuperar os movimentos. Ali o bicho pegou! É a dor física e mental. Me fez pensar bastante.
O que te motivou a voltar às pistas após uma experiência tão difícil? Houve algum momento específico que te inspirou?
O amor é maior que a dor. As dores que eu sinto não são nada perto do comprometimento que eu tenho com isso. Já provei por a mais b que não entrei nessa para brincar. Fiz do FMX a minha vida. Fiz da minha casa a minha pista. Da minha garagem, a minha oficina. Um lugar onde vão pilotos do mundo inteiro. Dali que trago minha motivação para continuar. É uma parada que eu não posso largar. Parar agora me traria mais prejuízo do que continuar. Vou levar isso para minha vida.
Qual foi a reação da sua equipe e da comunidade do FMX ao saber do seu acidente e sua recuperação? Você recebeu apoio de outros pilotos?
Eles conhecem esse trauma, essa dor. Eu operei e no dia seguinte já tinha uma galera no hospital me visitando, os gringos também. A galera abraça porque sabe o que você está passando, entende o momento. O pessoal é muito acolhedor. Isso faz toda a diferença para essa volta. Todos sabem da dor mental. É um compromisso que a gente tem consigo mesmo todo dia. O Fred Kyrillos também conversou muito comigo, tem a cabeça muito boa e me instruiu bastante. Faz toda a diferença esse apoio dos irmãos do FMX, fundamental pra recuperação.
Você tem alguma mudança de abordagem ou estratégia em mente para suas manobras, considerando a experiência por que passou?
Não digo uma estratégia nova para continuar andando e executar as manobras, mas quero dar um foco maior na parte de mídia e com certeza eu vou medir um pouco mais antes de colocar o meu na reta. Eu tive diversos sinais. Sou um cara muito temente a Deus. Eu tive diversos avisos. Quero ficar mais sensível aos sinais de Deus para continuar. Se eu sentir, não vou fazer. Não vai ter essa de amigos dizendo que é assim mesmo. Quebrou seu freio, está tudo bem. Já era o terceiro sinal que Deus estava me dando. Não consegui trocar os pneus. Tive que tirar peça de um amigo para colocar na minha moto que quebrou. Tudo isso na hora do campeonato. Tive o sinal para continuar no outro dia, deixar para revisar melhor a moto, ainda estavam mexendo na pista. Tudo isso estava no meu coração, mas me deixei levar pela galera que estava lá. A partir de certa idade você tem opiniões próprias, você tem que começar a se respeitar para saber até onde você deve ir. Vou começar a fazer isso agora, ter mais cautela. Ganhei agora essa expertise, não que eu não a tivesse, mas aprendi a me respeitar mais.
Além do FMX, que outros interesses ou hobbies você tem que ajudam a equilibrar sua vida fora das pistas?
Cara, eu sou muito fã dos esportes. Amo esportes de água, wakeboard eu curto pra caramba, surf. Tem tempo que não pratico, né, devido a esses dois últimos anos. Os dois últimos anos foram muito turbulentos, dois acidentes pesados, um com o braço, no qual eu também peguei uma infecção, e agora o do fêmur. Mas gosto de andar de jet ski, sempre quando posso faço um snowboard também. Estou sempre ligado ao esporte. Principalmente nos esportes com prancha. Também tenho uma mini ramp em casa, uma pistinha de skate. Curto muito.
Qual é a sua visão para o futuro do FMX no Brasil e que conselhos você daria a jovens pilotos que aspiram a seguir seus passos?
Cara, o futuro do FMX está em um nicho pequeno. Na verdade, só tem a gente. Só tem quinze caras no Brasil inteiro que são pilotos profissionais. Então essa peteca está na nossa mão. Depende muito da gente. Acredito que vai todo mundo trabalhar um pouquinho e a tendência é só crescer. Falando da minha parte, recentemente eu fiz investimentos com as estruturas infláveis que é o que tem de mais atual no mundo do freestyle. Consegui importar duas estruturas dessas, então isso já deixa a gente bem atualizado aqui no Brasil. Estamos em uma curva crescente, porém com poucos adeptos ao esporte. O lance do Freestyle cresce não só pelo esporte. Além do esporte, ele também tem a parte do show e isso é legal para caramba. Então se você não pratica o freestyle e não quer fazer esse esporte, você traz ele para sua cidade e faz um show. Faz uma demonstração virar um espetáculo. Então por mais que não tenha ainda muitos pilotos, existe uma linha crescente. E pra galera que está chegando, eu já ministrei alguns cursos aqui em casa, inclusive tem o Kleber Mazoni e o Polaco, que agora são pilotos profissionais ativos, e que são frutos desse curso que eu fiz aqui. Deve-se sempre procurar um profissional para orientar. O esporte não é brincadeira. Nenhum esporte é brincadeira, e o freestyle mais ainda. É um esporte de alto risco, então é bom respeitar, procurar alguém que já está na estrada há um tempo pra poder passar as dicas e coordenadas certas para o cara tocar a vida com alegria em cima da moto.
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